Siza Vieira diz que tocar na obra de Távora é “inqualificável” e “de uma arrogância enorme”

Siza Vieira diz que tocar na obra de Távora é “inqualificável” e “de uma arrogância enorme”

Siza VieiraSiza Vieira entende que a retirada pela Câmara do Porto da estátua “O Porto” da Casa dos 24, a última obra de Fernando Távora, falecido em 2005, é “inacreditável”, “inqualificável” e “de uma arrogância enorme”.

“Acho inacreditável, absolutamente inacreditável, que se tenha tocado seja no que for”, começou por dizer, reagindo à notícia do Porto24 de que o município havia transferido a estátua do guerreiro em granito, com cerca de 200 anos, para a Praça da Liberdade.
“É uma modificação de um elemento que está lá e que tem um sentido na arquitectura, simplesmente por aflição do presidente [da Câmara do Porto]. Valha-nos Nossa Senhora dos Aflitos”, criticou, esta segunda-feira, o arquitecto ao P24.
O arquitecto que tem obras por todo o mundo e recebeu em 1992 o Prémio Pritzker (considerado o Nobel da Arquitectura) acrescenta que o que a autarquia fez, “sem ouvir ninguém”, é “inqualificável”, sobretudo tratando-se de “um arquitecto considerado”, em Portugal e no estrangeiro, e de “um projecto celebrado” e que teve a concordância da mesma autarquia – a também conhecida como Torre da Câmara foi inaugurada por Rui Rio a 24 de Outubro de 2003.
“Admito que o presidente [da Câmara do Porto] não goste, mas, se isto acontecesse em todo o país, não sei o que ficaria de pé”, diz Siza Vieira.
Na cerimónia que visou assinalar o regresso da estátua à Praça da Liberdade, Rui Rio confessou que “desde o primeiro dia em que chegou à Câmara lhe causava uma certa aflição a estátua estar no sítio onde estava”.
A Rui Rio incomodava-o, sobretudo, o facto de a escultura “não estar próxima do sítio a que pertence, que é a antiga Praça Nova, como se chamava nessa altura, no início do século XIX, a Praça da Liberdade”.
Nem Siza foi ouvido

A estátua “O Porto” está desde sexta-feira na Praça da Liberdade. Foto: Miguel Oliveira
Sobre o local escolhido para acolher a escultura de João Alão, o co-autor do actual desenho da Praça da Liberdade também não foi ouvido. “Os projectistas, eu e o Souto Moura, não foram ouvidos. Ninguém nos perguntou nada, mas também ninguém nos perguntou para trocarem as árvores que estavam no nosso projecto”, lamenta o arquitecto, que diz serem, hoje em dia, “múltiplos os sinais de desprezo absoluto pelo que é a obra de arquitectura”.
“Não basta uma pessoa não gostar. A arquitectura não se resolve por referendo”, sublinhou na conversa telefónica com o P24, em que recordou que, “na grande manifestação contra o projecto da Avenida dos Aliados, estiveram 23 pessoas”.
Siza Vieira disse ainda ao P24 que Fernando Távora lhe mostrou o projecto durante a fase de concepção da Casa dos 24 e que ele foi uma das vozes que defenderam a sua visão, inclusive junto do então Instituto Português do Património Arquitectónico (IPPAR). “Sabendo que eu estava a fazer o projecto da Avenida da Ponte, ele quis mostrar-me o projecto e eu fiquei encantado. O projecto que ele fez é uma unidade e consegue fazer ler o envolvimento da Sé”, justifica Siza, explicando que aquela zona, “com as demolições dos anos 40″, havia ficado “desamparada”.
“Com um único bloco, ele consegue dar a ideia do que era a relação da Sé com a cidade”, sublinha Siza Vieira.
Esta sexta-feira, a Ordem dos Arquitectos e a família de Fernando Távora mostraram-se chocados com saída da simbólica estátua da Sé.
O P24 procurou, no mesmo dia, obter uma reacção da Câmara do Porto, mas até ao momento não foi possível obter uma resposta do município.
Notícia obtida in Porto 24
FacebookTwitterGoogle+LinkedInEmail